Escolha uma Página

O mercado jurídico é extremamente concorrido. Para não permanecerem fora do mercado, os profissionais precisam acertar mais do que errar. Alguns erros destroem carreiras imediatamente, outros erros, quando cometidos de forma reiterada, geram um paulatino esfacelamento.

Neste texto, não pretendo exaurir os erros que marcam a carreira de um profissional do Direito. Abordarei apenas três erros, justificando o critério de escolha no final do texto.

 

1. Deixar de ouvir

Verdadeiramente, as carreiras jurídicas exigem que os profissionais ouçam mais do que falem. Devem ouvir os clientes, as testemunhas, os colegas de carreira, o adversário etc.

Entretanto, com o excesso de trabalho ou em decorrência de uma aparente experiência que nos torna automatizados, como se algumas frases fossem gatilhos para determinadas respostas, tornamo-nos impacientes para ouvir.

Esse erro é constatado quando:

  • Juízes dizem às testemunhas frases como “limite-se ao que lhe é perguntado”, evitando que, eventualmente, sejam ditas circunstâncias importantes para a compreensão do fato ou do contexto.
  • Advogados e Defensores Públicos, durante o atendimento inicial, ouvem algumas frases dos clientes ou assistidos e, em seguida, propõem que estes resumam a narrativa. Também há aqueles que, de forma impaciente, ouvem determinadas expressões e indagam rapidamente se o objetivo do cliente ou assistido é aquilo que eles pensam que é. Ex.: ouvem o trecho “tive um filho” e, cortando a fala do cliente ou assistido, perguntam rapidamente “então você quer alimentos?”.
  • Professores ficam isolados no Olimpo – também chamado de “sala dos professores” – para que não ouçam as dúvidas dos alunos antes das aulas e durante os intervalos. Como sabemos, muitos alunos são tímidos e não querem expor suas dúvidas na frente dos outros alunos. Se o professor não permanece à disposição para ouvir os alunos durante alguns minutos antes ou depois das aulas – ou na “hora da merenda” –, esses alunos continuarão com suas dúvidas, pois provavelmente não tentarão entrar em contato por e-mail.
  • Autores de livros, doutrinadores e professores não dialogam com seus leitores, fazendo com que tudo se torne um mero monólogo em que alguns – leitores – permaneçam no papel passivo de ouvir aquilo que um – o “intelectual” – tem a dizer/escrever.
  • Orientadores de estágios jurídicos – do serviço público ou da iniciativa privada – não orientam. Orientar pressupõe ouvir o orientando (estagiário). Já vi “autoridades” que não falavam com seus estagiários. Também vi estagiários que precisavam pedir autorização ao assessor para que, em determinado dia da semana, pudessem falar com o indivíduo que os orientava.

2. Ouvir muitas pessoas

Este erro não contradiz o erro anterior. Precisamos ouvir o que deve ser ouvido, quando dito pelas pessoas que devem ser ouvidas.

Atualmente, um dos grandes problemas da sociedade não é a falta de informação, mas sim o seu excesso. Somos bombardeados com inúmeras opiniões, mensagens de texto, mensagens de voz, links, e-mails, notificações de celular etc. Às vezes, também recebemos alguma informação por cartas ou fax – e o fato de sabermos o que é isto já acusa a nossa idade.

Diante de tantas informações, repito: precisamos ouvir o que deve ser ouvido, quando dito pelas pessoas que devem ser ouvidas.

Se ouvirmos – e pior: acreditarmos em – todas as informações que nos alcançam, corremos o risco de permanecermos inertes, porque qualquer atitude sempre contrariará alguma informação ou opinião previamente recebida.

Também há o risco de que passemos a adotar como nosso o sonho de outros indivíduos. Um desses exemplos se refere aos concursos públicos. Conheço muitos alunos que declaram o desejo de passarem em algum concurso público, mas nunca conversaram com um concursado, tampouco imaginam como é estressante a carreira pública. Apenas ouviram familiares, amigos e colegas dizendo que concurso público é a melhor – ou única – opção.

Ouvir – incluindo ler ou ver perfis de redes sociais – colegas que declaram um “sucesso inigualável” no que fazem também é improdutivo. Como exemplo, podemos citar frases como “mais um HC concedido” ou “mais uma absolvição”.

O profissional que perde alguns segundos para ouvir esses profissionais que apenas apresentam seus resultados favoráveis – reais ou fictícios – poderá sofrer de complexo de inferioridade. Como já disse em outros textos, comparar seus bastidores – aquilo que o profissional sabe sobre os seus sucessos e fracassos – com o palco de outros profissionais – aquilo que os outros nos apresentam, que normalmente é um sucesso – gera um enorme desânimo.

Precisamos filtrar o que/quem ouvimos. O tempo é finito!

 

3. Viver em eterna competição

O mercado jurídico é extremamente concorrido, o que decorre da quantidade assustadora de cursos de Direito no país. Entretanto, a competição deve terminar no momento em que percebemos que é possível cooperar.

Infelizmente, ainda na faculdade, instaura-se uma competição desnecessária. Quem nunca perguntou ao colega quanto ele tirou na prova, torcendo para que a nota dele fosse menor que a sua? E quem nunca mentiu a nota para parecer que teve um desempenho melhor que o do colega? No futuro, percebe-se que as notas das disciplinas da faculdade valem tanto quanto o art. 212 do Código de Processo Penal na prática forense.

Há Juízes que não admitem que erraram ou que desconhecem alguma disposição legal, como se precisassem superar o conhecimento dos Advogados e Promotores que atuam no processo. Intimamente, talvez torçam para que o Tribunal reforme a decisão para que o erro não se perpetue.

Também há Advogados que encaram qualquer outro Advogado, de qualquer área e região, como concorrente, quando poderiam formar uma excelente e produtiva parceria. Aliás, no curso Como iniciar na Advocacia Criminal (veja aqui), realizado pelo Canal Ciências Criminais e ministrado por mim, dedicamos um módulo inteiro para falar sobre a formação de alianças e parcerias, tema pouco explorado no mercado jurídico, que, no máximo, preocupa-se apenas com comissões por indicação.

Como já falei em inúmeros outros textos, muitos Advogados de duvidosa ética insistem em utilizar como “método competitivo” uma atitude vergonhosa: procuram os clientes de outros Advogados e dizem frases como “o seu Advogado errou aqui” ou “eu teria feito de outro jeito”.

Ademais, existem profissionais que, por não terem iniciativa ou capacidade de execução, permanecem apenas falando mal de quem já executou ou está executando algo, ainda que se coloquem em situações ridículas perante seus pares, que reconhecem se tratar de mera inveja.

Evidentemente, há muitos outros erros diuturnamente cometidos pelos profissionais do Direito, como a falta de leitura, a desonestidade, a atuação em áreas desconhecidas pelo profissional, a prática de crimes para favorecer (ou prejudicar) clientes etc.

De qualquer forma, o enfoque nos três erros anteriormente citados tem um ponto em comum: os três se relacionam com as relações interpessoais, que, infelizmente, estão sendo esquecidas no cenário jurídico em prol da mera busca de contatos profissionais (networking).

Os profissionais das carreiras jurídicas – públicas e privadas – precisam ser constantemente alertados de que não se trata apenas de honorários, subsídios, recessos forenses, licenças, auxílios, livros, peças processuais, gabinetes, escritórios, ternos, folhas timbradas etc. Trata-se, em primeiro lugar, de pensar nas pessoas com quem lidamos e para quem atuamos.

[activecampaign form=4]

 

Escrito por: Evinis Talon

Fonte: Jusbrasil