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Deparei-me nas semanas passadas com minha primeira experiência advocatícia no crime de tráfico.Família distante procurou-me a partir da internação de filho adolescente (15 anos de idade), capturado em flagrante de tráfico de maconha – algumas “tacas” numa mochila – em beco da região metropolitana.

Apreensão, internação [preventiva], audiência de apresentação, audiência de continuação, alegações finais e sentença, tudo isso num período de 20 dias.

Razões óbvias: família desestruturada; mãe desaparecida; pai doente e ausente; outros familiares deveras distantes; inserção sócio-econômica precária; personalidade ainda em formação e facilmente influenciável; ausência de perspectiva de vida; ilusão sócio-econômica com o mundo do tráfico.

O menino, então, se entrega a esse mundo. Não é sua primeira apreensão, e a polícia da região atesta tê-lo visto inúmeras vezes nas mesmas condições de ilicitude, nos últimos meses.

O resquício de família tem diante de si um dilema: pretender soltar o menino ou pretender deixá-lo internado. Dessa decisão depende a estratégia advocatícia.

Fora do CENSE é muitíssimo provável que o adolescente retorne à sua condição anterior. E essa “vida” possui trajetória elementar. Enquanto for adolescente as internações variam de 45 dias a 6 meses. Mas quando for adulto a condenação é maior, e o cumprimento de pena é em penitenciária.

No CENSE o adolescente pode receber algum tratamento psicológico e mesmo alguma educação formal ou técnica / tecnológica, porém, receberá conjuntamente algum aprendizado ou no mínimo algum networking conectado ao crime.

No CENSE ou fora dele, portanto, o adolescente pode permanecer na situação de criminalidade, ou em situação pior – quando avistamos estatisticamente a expectativa de vida desse mundo e dessa “vida”.

Daí o dilema da família que ainda resta ao menino. Familiares distantes que não possuem condições de acolhê-lo, mas que obviamente se importam com ele. Um dilema quase paradoxal, pois ao fim o resultado – soltar ou internar o adolescente! – pode ser muito semelhante.

Recebo da Juíza e da Promotora, nos 20 dias de trâmite da causa, a infeliz e implacável informação de que esse é o seu cotidiano: processar e julgar menores infratores, cujo contexto de “vida” é precisamente idêntico ao desse menino. E são inúmeros. No Brasil, milhares.

Fica realmente muito fácil constatar, o que temos feito nos últimos anos em pesquisas no campo da Economia Política e do Direito Penal, que a problemática das drogas e de toda essa conjuntura de fatos com as crianças e adolescentes brasileiras/os é fato muito mais elementarmente atrelado a aspectos econômicos do que a aspectos morais.

Convém estudar, na origem, portanto, a economia do crime, e não a sua estrita tipicidade.

 

Escrito por: André Peixoto de Souza

Fonte: Canal Ciências Criminais